Um bom exemplo de que esta crença na superioridade natural de uns grupos relativamente a outros está viva e é partilhada por um número significativo de europeus encontra expressão no facto de cerca de 30% desta população acreditar que «algumas raças ou grupos étnicos nascem menos inteligentes do que outros» e também que «nascem mais trabalhadores do que outros», segundo dados do Inquérito Social Europeu (European Social Survey 7, 2014-2015) [...] Portugal, a Estónia e a República Checa são os países onde um maior número de pessoas expressou adesão à crença de que há, por natureza, grupos inferiores e grupos superiores quanto às características que definem os humanos. Ou seja, Portugal encontra-se entre os países que manifestaram um índice de racismo mais elevado. Por sua vez, a Suécia, a Holanda e a Noruega são os países onde menos pessoas manifestam de forma aberta adesão a essas mesmas crenças [...] Todavia, estes dados mostram também que o racismo está longe de ser hoje uma ideologia consensual na Europa, como o foi antes da II Guerra Mundial. Hoje, estas crenças não são partilhadas pela maioria dos Europeus e são objeto de debate público e político.
No que respeita a Portugal, os resultados apresentados podem parecer surpreendentes e são difíceis de aceitar pelas elites políticas, por comentadores ou redes intelectuais, mas são dados que já haviam sido anunciados num inquérito publicado em 1999 e num outro de 2011. Neste último estudo, comparou-se Portugal com outros oito países europeus. De novo com base em amostras representativas, perguntávamos, entre outros indicadores, qual o grau de concordância com a seguinte frase: «Algumas raças são mais dotadas do que outras.» Os resultados obtidos evidenciam que na Alemanha, em França, no Reino Unido, na Holanda e em Itália menos de 50% dos inquiridos expressaram concordância com aquele indicador de racismo. Em Portugal, na Polónia e na Hungria essas percentagens crescem para valores iguais ou superiores a 50% [...] Muito importante, os inquiridos [...] também mostram disponibilidade para discriminar ou aceitar a discriminação racial em diversos planos da vida social e política, como a oposição à entrada de imigrantes percebidos como tendo outra raça, na oposição a leis antirracistas ou a opção por critérios etnicistas na seleção de imigrantes.
Mais recentemente, já em 2019/2020, o European Social Survey - Portugal voltou a diagnosticar a crença dos Portugueses na «superioridade natural de umas raças ou grupos étnicos relativamente a outros». Usando as mesmas proposições do European Social Survey 7, recorreu-se agora não a uma escala de resposta dicotómica (sim/não), que poderia ter produzido enviesamentos nas respostas anteriores, mas a uma escala que ia de «totalmente de acordo» a «totalmente em desacordo», permitindo uma gradação dos graus de acordo e desacordo. Os resultados obtidos, agora apenas em Portugal, confirmam os estudos precedentes: mais de 40% dos inquiridos partilha a crença na superioridade natural de «umas raças relativamente a outras», ou seja, expressam racismo biológico.
Jorge Vala – Racismo, Hoje, Portugal em Contexto Europeu (2021)
Fundação Francisco Manuel dos Santos, Jorge Vala (2021)