O senhor é o exemplo do estado caótico da sociedade. Talento sem bom-senso; barbárie e cultura; grandes princípios e falta de espírito para os exercer. Sensibilidade e egoísmo que a simula; discursos pomposos e miséria da experiência.
Agustina Bessa-Luís –Fanny Owen(1979)
Colecção Mil Folhas / Bibliotex SL / M.E.D.I.A.S.A.T. e Promoway Portugal Ltda (2002)
"Your father made very good investments," Bernie said.
She asked, "What did he invest in? I know he was an investment banker, but what did he invest in that made all this money? My God, Bernie, that's a lot of money."
"South Africa", Bernie said, glancing at some sheets of paper in from of him. "Way back [...]
"South Africa?" Suzanne asked. "Are you saying back when there was apartheid he was investing over tehre?" Bernie nodded, and she said, "But he didn't, Bernie. I asked him - when Mandela got released from prison - I asked my father if he had invested in South Africa and he said, 'No, Suzanne,' He told me that."
Bernie put the papers back into a folder.
"I'm giving it all way. Every penny. I don't want it." Suzanne sat back. "My God," she said.
Bernie said, "Do with it whatever you like."
Elizabeth Strout – Olive, Again (2019) Penguin Random House UK (2019)
Havia brasileiros e barões em grande abundância, e Camilo, olhando as suas correntes cruzadas nos coletes bordados, dizia alto: «Um asno carregado de dinheiro trepa por onde quer [...]».
Agustina Bessa-Luís –Fanny Owen(1979)
Colecção Mil Folhas / Bibliotex SL / M.E.D.I.A.S.A.T. e Promoway Portugal Ltda (2002)
Outro dos engulhos no trabalho de Lurdes e João passava pela relação com as chefias e pelos fluxos de informação e de decisão. Chefias muitas vezes distantes, impotentes, sujeitas a remodelações constantes e à implementação sucessiva de novos modelos. «As direcções estão dispersas, às vezes muito afastadas dos centros de saúde. Criaram o ACES [Agrupamento de Centros de Saúde], e há necessidades muito diferentes que às vezes não são satisfeitas.» Por exemplo, segundo João, há exames que os médicos prescrevem e que só podem ser realizados se as chefias do ACES autorizarem. «Os médicos não têm autonomia, nem mesmo em situações de urgência. A verdade é que muitas vezes não estamos a resolver os problemas dos utentes. Uma pessoa vai com um problema grave ao centro de saúde, na zona rural, ou aqui, no Algueirão, e tem de esperar que a direção em Massamá decida.» Nos últimos tempos em que esteve ao serviço, uma das funções de João passava pelo acompanhamento dos pedidos de tratamento de fisioterapia e de terapia da fala, muito solicitados por pessoas que tivessem sofrido um AVC. Se se concluísse que o tratamento iria ter uma duração superior a 120 dias, «e em caso de AVC isso era muito comum», o pedido entrava em modo de espera, até vir aprovado pela direcção do referido ACES. «A gente punha-se no lugar daquelas pessoas e achava que elas tinham razão. Elas iam ter connosco e nós dizíamos "agora volte cá daqui a oito dias, para saber se tem direito". É claro que isso gerava revolta. E perturbava o atendimento.» Na ética de serviço de João e Lurdes, era inevitável trazer esses problemas para casa. «Imagine o que é uma pessoa a quem foi amputada uma perna, que anda a fazer trabalho de recuperação, e a quem é dito "agora tem de interromper até vir nova autorização". Os meus últimos anos de trabalho foram muito complicados por causa destas situações.»
Pedro Vieira – Em que posso ser útil? (2021)
Fundação Francisco Manuel dos Santos e Pedro Vieira (2021)
[...] ensinaram que a sabedoria de vida se conquista com experiência e solidariedade e não com graus académicos; que os seres humanos, mesmo nas condições mais adversas, não perdem a esperança, o desejo de transcendência e a aspiração de justiça; que há muitos conhecimentos, para além dos académicos e científicos, muitas vezes nascidos nas lutas contra a opressão e a injustiça; que a solidariedade não é dar o que sobra mas o que faz falta; que a sociedade injusta não é uma fatalidade; e que o amanhã não é um futuro abstrato – é o amanhã mesmo.
A nossa sociedade tem perdas que são socializadas e lucros que são privatizados porque as transações e investimentos nem sempre têm de ser públicos, para que haja empresas que continuam a receber auxílios estatais, apesar de distribuírem dividendos aos seus acionistas
No primeiro caso, falamos de um espectador regular do cinema, que abordou Soraia a propósito de um pretenso convite. «Veio à bilheteira e disse-me que estava na lista de convidados daquela noite. Fiz a pesquisa e não encontrei o nome, ao que ele me respondeu: "Sabe quem é que eu sou? Sou professor universitário. Procure lá isso bem, ou não sabe ler?"» Remoque ignorado, nova vista de olhos à lista de convidados. «Peço imensa desculpa, mas o seu nome não está aqui.» «Olhe, é por causa de pessoas como a menina que o país está como está. Você não tem instrução nenhuma e está-me a dizer a mim, que sou professor universitário, que eu não tenho o meu nome na lista. Provavelmente a menina nem sabe ler.» «Eu insisti que já tinha verificado várias vezes, mas ele não desarmou. "Você é uma incompetente, está aqui porque não arranja trabalho em mais lado nenhum. Deve estar aqui por caridade. Você não serve para nada." E foi-se embora.» Trémula, com os olhos marejados, Soraia acabou por ser consolada por duas clientes que assistiram à cena [...] «A verdade é que as duas senhoras me acalmaram, compraram os bilhetes delas, foram-se embora, mas depois voltaram. Trouxeram-me um pacotinho de M&M's "para alegrar o seu dia".» Mas o verdadeiro golpe de teatro (curiosamente, num cinema) estava guardado para mais tarde. Duas ou três horas depois do desaguisado, eis que surge o cliente destemperado, desta vez com um pedido de desculpas. «Eu nem queria acreditar. Ela volta à bilheteira e diz: "Queria pedir-lhe desculpa, porque falei consigo de uma forma como não devia ter falado." Fiquei estupefacta, não sei se ele me viu a chorar, a ser consolada pelas outras senhoras, ou se foi porque não lhe respondi... Se calhar estava à espera que eu alimentasse a coisa. Mas pronto, teve ali um rebate de consciência.» A acompanhar o arrependimento, o professor universitário trouxe uma caixa de bombons, que ofereceu a Soraia. «Apanhei uns nervos terríveis... mas acabei o dia cheia de chocolates.»
Pedro Vieira – Em que posso ser útil? (2021)
Fundação Francisco Manuel dos Santos e Pedro Vieira (2021)
Odeio cerimónias, lamentações [...] Odeio igualmente a pompa, a indiferença e o ênfase, sempre colocado no local errado, de todas as pessoas que se pavoneiam à luz de candelabros envergando vestidos de noite, estrelas e condecorações
Virginia Woolf – As Ondas (1931)
Colecção Mil Folhas / Bibliotex SL / M.E.D.I.A.S.A.T. e Promoway Portugal Ltda (2002)
Imagine que é convidado a responder à seguinte pergunta: «Em que medida considera que as pessoas negras e as pessoas brancas em Portugal são muito diferentes, diferentes, semelhantes ou muito semelhantes no que se refere aos valores que ensinam aos filhos?» Imagine que seguidamente teria de responder à mesma questão, agora relativamente ao grau de preocupação que brancos e negros têm com o bem-estar das famílias, a religião, a educação das crianças, os comportamentos sexuais, etc. Esta questão foi objeto de estudo numa pesquisa, já citada, realizada nos anos 90, no quadro do Eurobarómetro. Os resultados mostraram que, quanto mais os respondentes acentuavam as diferenças culturais entre os cidadãos dos países inquiridos e os imigrantes de países não-europeus, considerando-os culturalmente muito diferentes, mais manifestavam racismo biológico e mais consideravam que os imigrantes - por exemplo, pessoas negras no caso de Portugal - eram incapazes de se adaptar à sociedade de acolhimento [...] à primeira vista acentuar ou exagerar as diferenças culturais não pareceria estar relacionado com racismo tradicional e discriminação. Contudo, os resultados são claros e têm mostrado consistência ao longo de 30 anos de pesquisa. A preocupação de Lévi-Strauss tinha razão de ser: a associação subtil entre diferença e inferioridade é prova disso.
Jorge Vala –Racismo, Hoje, Portugal em Contexto Europeu(2021)
Fundação Francisco Manuel dos Santos, Jorge Vala (2021)
- Como se há-de ser virtuoso numa cidade assim? Uma cidade que prospera e não avança um passo. Onde os literatos se elogiam uns aos outros porque são igualmente pobres. Onde temos de ser sensíveis à gratidão para não tomarmos o gosto a sermos beneméritos.
Agustina Bessa-Luís –Fanny Owen(1979)
Colecção Mil Folhas / Bibliotex SL / M.E.D.I.A.S.A.T. e Promoway Portugal Ltda (2002)