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Nariz de cera

anotações e apontamentos que dizem tudo - de, por e para mim - por si mesmos.

anotações e apontamentos que dizem tudo - de, por e para mim - por si mesmos.

Nariz de cera

28
Mar23

Some of us are wise / Every other person over wise / Organize

Cecília

Veste a bata, vai buscar o carrinho a transbordar de detergentes, panos e esfregonas e segue o seu caminho. Tem três horas para limpar corredores, elevadores e escadas de um edifício com três andares. [...] O que se segue pode parcer simples em palavras, mas torna-se cansativo na prática: das seis às nove faz limpezas, das dez às 19 horas trabalha num call center e à terça-feira e quinta-feira, meia hora depois de terminar o atendimento a clientes de uma empresa, já está a tomar conta de uma criança, trabalho que se prolonga até às dez e meia da noite. Pelo meio, tem então uma hora entre as limpezas e o call center, uma hora de almoço, 15 minutos de descanso entre chamadas e meia hora entre o call center e o babysitting.[...] Resta dizer que, no meio de todos estes trabalhos, Ana Isabel ainda conseguiu montar o seu negócio de venda online de quiches, com sabores são-tomenses, brasileiros e portugueses.

E tudo isto, a começar nas limpezas e a terminar nas crianças, para quê? Ana Isabel só quer juntar dinheiro para conseguir pagar outro mestrado. 

 

Rita Pereira Carvalho  – As Invisíveis, Histórias sobre o trabalho de limpeza (2022)

Fundação Francisco Manuel dos Santos, Rita Pereira Carvalho (2022)

 

 

20
Set21

consciências desfasadas

Cecília

Em Portugal, a tomada de consciência de que o racismo é incompatível com a democracia e os valores de liberdade e igualdade é ainda mais recente do que no resto da Europa. Após a II Guerra Mundial, Portugal não podia fazer a condenação oficial do nazismo e do fascismo pois fora um ator supostamente neutro nesse processo e era governado por uma ditadura. Além disso, Portugal era um Estado colonial, sendo as relações com os povos das colónias africanas reguladas nomeadamente pelo «Estatuto dos Indígenas», entre 1926 e 1961. É nesta última data que aquele estatuto é revogado por nova legislação, introduzida quando a guerra colonial já se havia iniciado. Esta nova legislação, que corrige marcadamente a versão de 1926, é mais uma consequência do pavor da luta pela independência das colónias do que de uma genuína promoção de relações de trabalho justas. Esta observação é sustentada pelo facto de, dez anos após a legislação de 1961, a Organização Internacional do Trabalho ainda considerar que Portugal não respeitava nas colónias os princípios defendidos por essa mesma organização.

Com o 25 de Abril, o espírito da Declaração Universal dos Direitos Humanos foi integrado na Constituição de 1976 e entrou progressivamente nas instituições portuguesas. Porém, só em 1978, 30 anos após a aprovação pela ONU da Declaração Universal dos Direitos Humanos, Portugal apoia essa declaração, ao mesmo tempo que subscreve a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, criada em 1953. 

 

Jorge Vala  – Racismo, Hoje, Portugal em Contexto Europeu (2021)

Fundação Francisco Manuel dos Santos, Jorge Vala (2021)

 

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10
Mai21

alunos com patente

Cecília

Para essas e outras famílias com o mesmo tipo de simbolismo era vital chegar à fronteira antes dos nazis : a corrida tinha começado. Uma corrida na qual os alemães contavam com alguns trunfos: a velocidade à qual avançavam, com um material de grande qualidade, e em quantidade; apoios das forças colaboracionistas de Pétain e de Franco, e o apoio "tranquilo" de "um bom aluno" - António de Oliveira Salazar, com uma Circular 14 mesmo oportuna. 

 

António Moncada S. Mendes – Aristides de Sousa Mendes, Memórias de Um Neto
Edições Saída de Emergência e António Moncada S. Mendes  (2017)

 

in https://plataformacascais.com/component/tags/tag/big-pharma.html

 

 

24
Nov20

gente que se diz muito avançada

Cecília

- A 7 de janeiro de 1983 fomos os dois à festa do Pós-Modernismo, organizada pelo Leonel Moura na Sociedade Nacional de Belas-Artes. O António ia vestido com uma rede de capoeira, por cima de uma camisola de malha cinzenta e uns collants. A rede, fui eu que lha moldei ao corpo, com fechaduras e dobradiças. Depois, pus-lhe um cinto de correntes, e cosi-lhe, nos braços e nas pernas, fechaduras e dobradiças de portas. Foi a toilette mais espampanante que ele alguma vez usou - conta Teresa Couto Pinto [...] Mas quando António Variações entra na festa que assinala o evento, há um frémito de espanto, um silêncio brevíssimo, uma alegria. Passaram tantos anos, mas Leonel Moura, um dos grandes promotores do evento, recorda-se de ter dito aos seus pares: «este tipo não está inserido no nosso movimento, mas é muito mais avançado e radical do que toda esta gente que se diz muito avançada e muito de vanguarda». E acrescenta:

- Porque ele apareceu vestido à maneira dele, mas particularmente exuberante, com uma rede de galinheiro, um puxador de porta pendurada na orelha, um cinto de correntes, um bocado na onda do punk, mas em Portugal não havia nada assim. Aliás, a moda que estava também em exposição era uma coisa muito banal, não deixou rasto. Eventualmente alguns cresceram, e tornaram-se estilistas mais conhecidos, mas ali a sua intervenção não marcou. O Variações sim. E, provavelmente sem o saber, era realmente o artista pós-moderno por excelência. 

 

Manuela Gonzaga – António Variações, Entre Braga e Nova Iorque (2018)

Manuela Gonzaga e Bertrand Editora (2018)

 

 

21
Mar17

ficar a trinar

Cecília

Percebes logo que o doutor Cavedagna é aquela personagem indispensável em todo o organograma empresarial em cujos ombros os colegas tendem instintivamente a descarregar todas as tarefas mais complicadas e espinhosas. 

 

 

Italo Calvino – Se Numa Noite de Inverno Um Viajante (1979)
Coleção Mil Folhas PÚBLICO (2002)

 

 

 

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