privado
Não era mau ser-se estúpido desde que a ignorância fosse verdadeiramente nossa.
Charles Bukowski – Mulheres (1978)
Coleção Mil Folhas PÚBLICO (2003)
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anotações e apontamentos que dizem tudo - de, por e para mim - por si mesmos.
anotações e apontamentos que dizem tudo - de, por e para mim - por si mesmos.
Não era mau ser-se estúpido desde que a ignorância fosse verdadeiramente nossa.
Charles Bukowski – Mulheres (1978)
Coleção Mil Folhas PÚBLICO (2003)
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Recém-chegado da tropa no ultramar, no início dos anos 70, António ainda não pertencia ao meio musical. Mas, pela forma de estar, de vestir, e de ser, começava a ser um Extraterrestre, num país onde era pecado ser diferente, numa sociedade que tranquilizava os seus terrores arcaicos com a estandardização. «Sempre Ausente», um poema do álbum Anjo da Guarda, ilustra estes tempos e esta busca:
Diz-me que solidão é esta
Que te põe a falar sozinho
Diz-me que conversa
Estás a ter contigo
Diz-me que desprezo é esse
Que não olhas p'ra quem quer que seja
Ou pensas que não existe
Ninguém que te veja
Que viagem é essa
Que te diriges em todos os sentidos
Andas em busca dos sonhos perdidos
Manuela Gonzaga – António Variações, Entre Braga e Nova Iorque (2018)
Manuela Gonzaga e Bertrand Editora (2018)
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Em julho e agosto de 1940, quando vinha a Lisboa, Aristides reunia-se com amigos e familiares. Precisava de falar dos acontecimentos. Algumas vezes, encontrou-se com o rabino Kruger, que esperava em Lisboa por um barco que o levasse, e à família, para o novo mundo. O tema principal das conversas era, invariavelmente, a guerra. Kruger, naturalmente, mostrava a sua dor pelo sofrimento causado por Hitler ao povo de Israel, mas ao saber que Aristides enfrentava a raiva de Salazar, terá lamentado: «Tudo o que está a sofrer agora por nossa causa!», e Aristides, que procurava sempre dar-lhe algum consolo por tanto infortúnio, respondeu-lhe: «Se milhares de judeus estão a sofrer por causa de um católico [Hitler], então é compreensível que um católico [Aristides] possa sofrer por causa de tantos judeus. Eu não podia ter agido de outro modo, por isso aceito, com amor, tudo o que me aconteceu e poderá vir a acontecer por causa do meu gesto.»
António Moncada S. Mendes – Aristides de Sousa Mendes, Memórias de Um Neto
Edições Saída de Emergência e António Moncada S. Mendes (2017)
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Esses registos ficarão para sempre guardados na minha memória e comigo, por uma única e simples razão: as conversas que se têm com os amigos não se divulgam sem autorização.
Manuela Gonzaga – António Variações, Entre Braga e Nova Iorque (2018)
Manuela Gonzaga e Bertrand Editora (2018)
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Ao ir embora, o padre disse que a mãe estava agarrada ao tio Carlos. Era ela quem o mantinha vivo. Era por estar sempre a pensar nele que o tio não partia. Mesmo enquanto não estava à cabeceira da cama, a mãe não parava de rezar [...] E durante todo aquele tempo em que se esgotara a fim de ajudar o tio, a minha mãe não tinha feito mais do que prejudicá-lo.
«Não pode ser», pensava. «A mãe é boa. Era ela quem se levantava a meio da noite para ver se ele precisava de alguma coisa.»
A mãe estava do lado do bem. Mas era por ser tão boa que o sofrimento do tio não tinha acabado mais cedo. Tinha acabado de ser convertida numa pessoa desprezível por se ter esforçado tanto a fim de manter alguém vivo.
Hugo Mezena – Gente Séria (2017)
Planeta Manuscrito (2018)
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amigos que falavam sem freio como o Nélson e por amigos como o Samuel, cujo silêncio dizia mais.
Afonso Reis Cabral – Pão de Açúcar
Publicações Dom Quixote (2018)
PAR Impar 1 2 1 (1915-16)
Amadeo de Souza Cardoso
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quando envelhecem as pessoas aproximam-se de voltar a nascer, choram por nada, falam do que não aconteceu, coleccionam ideias que não há
António Lobo Antunes – A Última Porta Antes da Noite (2018)
Publicações Dom Quixote (2018)
Composition ou Pim! Pam! Poum! (1934)
Maria Helena Vieira da Silva
https://gulbenkian.pt/museu/works_cam/composition-ou-pim-pam-poum-147112/
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- Falávamos mais das clientes, do que dos cabelos. Do feitio, da maneira de ser delas. Nós somos cabeleireiros, somos médicos e somos padres. É uma terapia. Antes era, pelo menos. Mas... é muito esquisito. As mulheres sabem perfeitamente quem nós somos, às vezes até nos contam a vida toda, mas na rua são capazes de não nos falarem. Fingem que não nos veem. Chegámos a encontrar clientes nossas no Pap'Açorda que, ali, faziam de conta que não nos conheciam. Gente supostamente educada, com apelidos sonantes. E nós, é claro, gozávamos imenso com isso. É óbvio que quando ele se tornou um artista conhecido, já faziam gala em conhecê-lo. Se só fosse cabeleireiro, não.
Manuela Gonzaga – António Variações, Entre Braga e Nova Iorque (2018)
Manuela Gonzaga e Bertrand Editora (2018)
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Em geral, os bois na corte por baixo do meu quarto faziam-me muita companhia. Era um mugido longo e sincero, profundo (...) O mugido franco e despretensioso desses animais contrastava com a voz do avô, que passava os dias no quarto a falar sozinho. Quem parecia que falava eram os bois, tal a serenidade com que mastigavam a palha e assistiam a este espectáculo.
Hugo Mezena – Gente Séria (2017)
Planeta Manuscrito (2018)
Paturages
Julien Dupré
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