Aristides III
O ano de 1991 é de eleições legislativas em Portugal, e como é habitual os partidos vão para a estrada, percorrer o país em campanha eleitoral. O PSD, liderado pelo então primeiro-ministro, Cavaco Silva, passa por Carregal do Sal, perto de Cabanas de Viriato. Uma senhora amiga da minha tia Joana ("a teimosa") convida-a a passar lá uns dias, de modo a que possa encontrar-se, de passagem, com Cavaco Silva, para o interpelar sobre o 3.º artigo da Lei de Reabilitação de 1988 (a indemnização à família), que continuava por cumprir. Cavaco Silva, amavelmente, respondeu a Joana:« O seu pai era certamente um homem bondoso, mas... desobedeceu, lamento, minha senhora.» O processo não avançou (...)
Em 2005 recebo um convite para ir assistir a uma conferência na Universidade Católica, no Edifício João Paulo II. Era de Otto von Habsburg, que tinha vindo a Lisboa proferir uma conferência sobre o seu falecido pai, o último imperador da Áustria, recentemente beatificado. O auditório estava cheio de gente, e entre eles, em lugar de destaque, o Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, e a mulher. As primeiras palavras de Otto von Habsburg foram para dizer que iria dedicar 15 minutos à memória de Aristides de Sousa Mendes, o homem a quem ele devia a vida e a possibilidade de ali estar naquele dia, graças à sua ação de salvamento em Bordéus, durante a Segunda Guerra, desobedecendo a ordens superiores.
António Moncada S. Mendes – Aristides de Sousa Mendes, Memórias de Um Neto
Edições Saída de Emergência e António Moncada S. Mendes (2017)