Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Nariz de cera

anotações e apontamentos que dizem tudo - de, por e para mim - por si mesmos.

anotações e apontamentos que dizem tudo - de, por e para mim - por si mesmos.

Nariz de cera

31
Mar22

esmagar a rotina que esmaga

Cecília

Entre formação e atendimento propriamente dito, Ricardo trabalhava para a Livingbrands Portugal há três meses, altura em que lhe propuseram subir de patamar. Deixaria para trás os telefones e os tablets e passaria a dar assistência a quem comprava computadores, portáteis e de secretária. «Foi a partir daí que as coisas começaram a correr muito mal para o meu lado.» A mudança de funções implicou uma semana de formação específica e um crescimento na exigência do serviço a prestar, sem qualquer melhoria na remuneração. «Achavam que ficávamos gratos pela simples aposta em nós.» Mas foi o aumento da pressão que acabou por arruinar a experiência de trabalho de Ricardo. «Comecei a ter de lidar com problemas muito mais complexos, e eu achava que não tinha apoio nem competências suficientes para os resolver. Ao fim de pouquíssimo tempo, disse-lhes que a coisa não estava a resultar, partilhava com eles as minhas inseguranças, e eles mandavam-me continuar: "Está tudo a correr bem, não te preocupes."» Dada a elevada rotatividade de funcionários desde as fases mais embrionárias do processo, os responsáveis tentam responder às crescentes solicitações e aos objectivos da Apple com a matéria-prima que têm à mão, com aqueles que se aguentam há dois, três meses. Nesta fase, e tendo em conta as saídas constantes, acabam por ser encarados quase como seniores do serviço de apoio ao cliente. «Eu achava que não estava a corresponder e comecei a entrar mesmo em stress, sentia dores de cabeça terríveis - sempre as tive, mas ali agravaram-se -, sentia ansiedade, pânicos.»

 

Pedro Vieira – Em que posso ser útil? (2021)

Fundação Francisco Manuel dos Santos e Pedro Vieira (2021)

 

 

03
Mar21

a saúde está no coração

Cecília

Sebastião (...) ao despedir-se do pai prometeu-lhe, diante da mãe, que iria contar ao mundo a história da atitude heroica do cônsul de Bordéus em 1940. E assim o fez. Em agosto de 1945 instalou-se na Califórnia, e com o irmão Carlos Francisco Fernando começou a divulgar o gesto de rebeldia praticado pelo pai, que tantas vidas tinha salvado, e que era uma verdadeira proclamação dos direitos humanos. Escreveu vários rascunhos (...)

Mas nos anos que se seguiram ao apocalipse que foi a Segunda Guerra Mundial, a Humanidade não estava preparada para ler histórias de morte, destruição e iniquidade. As pessoas queriam olhar para um futuro menos escuro, menos duro. Acabavam de sair do inferno, queriam esquecê-lo, queriam aproveitar o que a vida tinha de bom para lhes oferecer, e deixar para trás os anos de luta e desesperança. É verdade que havia filmes sobre a guerra, e as pessoas iam ao cinema vê-los, mas era difícil o processamento, de um ponto de vista mais racional, mais intelectual, de um horror como a carnificina que foi o Holocausto. Era muito penoso, como coletivo, termos de nos interrogar sobre as razões que permitiram que tal monstruosidade acontecesse. 

Teriam de passar 70 anos para que os países que participaram na Segunda Guerra Mundial se voltassem para esse período da História, fizessem eles parte dos vitoriosos ou dos derrotados. Essa já era uma história que tinha sido vivida pelos nossos avós, duas gerações tinham nascido e crescido depois daquele horror, e agora desejavam compreender minimamente aquilo que pais e avós não puderam entender. 

 

António Moncada S. Mendes – Aristides de Sousa Mendes, Memórias de Um Neto
Edições Saída de Emergência e António Moncada S. Mendes  (2017)

 

 

11
Nov20

caminhada

Cecília

Como se seguisse o exemplo do samaritano, a contrariar ordens vindas de homens, Aristides abdicou da carreira, da família, dos amigos e do seu estatuto social, num país que vivia num sistema ditatorial e onde as aparências valiam muito. Preferiu o castigo que se abateu sobre ele e a raiva de certos grupos sociais, que perdura até aos nossos dias neste país. Porém, morreu com a certeza de que a aposta a respeito de Deus tinha sido totalmente ganha. 

Filósofos, pensadores e santos acolheram com grande satisfação a atitude rebelde de Aristides. A Humanidade precisava (e precisa) de gestos desta natureza e dimensão para continuar a sua caminhada. 

 

António Moncada S. Mendes – Aristides de Sousa Mendes, Memórias de Um Neto
Edições Saída de Emergência e António Moncada S. Mendes  (2017)

 

 

02
Abr20

apostar na equipa certa

Cecília

Mas em 1983 e em 1984, as autoridades responsáveis pela saúde dos portugueses não estavam informadas, logo, não sabiam como encarar o problema. Portanto, desmentem-no. A sida não existe. A exstir, é noutros países. Não há pragas nem epidemias. O director do Instituto Nacional do Sangue multiplica-se em entrevistas e vai à televisão desmentir a gravidade da situação e pedir às pessoas para não se preocuparem porque Portugal era um país de bons costumes. Só uma mulher, investigadora, estava atenta, e, pior do que isso, preocupadíssima. Odete Santos tinha ouvido falar da doença em 1983, num congresso em Lausanne, na Suíça, para onde foi a convite da maior especialista mundial em infeções hospitalares, que lhe diz: «Se for o que a gente pensa, vai ser uma desgraça!» Odete Santos, que trabalhava com o Instituto Pasteur, em Paris, pediu para ser apresentada ao professor Montagnier, o virologista francês que isolara o vírus... e contra tudo e contra todos iniciou uma batalha pelo conhecimento da doença, em Portugal... Numa enorme solidão, como ela própria admite, a cientista foi discriminada. As pessoas chegavam a mudar de passeio para não lhe falarem... Mas em 1985, com uma equipa diminuta na Faculdade de Farmácia, Odete Santos entra para a História da Medicina ao isolar o VIH-2... (...) A partir daí, a sida, em Portugal, não apenas existe como tem direito a bilhete de identidade. 

 

Manuela Gonzaga – António Variações, Entre Braga e Nova Iorque (2018)
Manuela Gonzaga e Bertrand Editora (2018)

 

 

 

02
Nov19

epifania

Cecília

a morte é isto:

abundância

 

 

Paulo da Costa Domingos in CAMPO DE TÍLIAS

 

 

Paulo da Costa Domingos – Carmina (1971-1994)
Antígona (1995)

 

 

The-Last-Judgement-by-Alun-Salt.jpg

 

The Last Judgement (1533 - 1541)

Michelangelo Buonarroti

 

 

17
Jul18

resta ressuscitar

Cecília

O teu avô pisava as uvas para fazer vinho, não era? Quando se chega a esta idade somos umas uvas, pisadas a vida inteira. Um dia, Nosso Senhor transformar-nos-á em vinho. Sofremos tanto que já só podemos ressuscitar, já não nos sobra mais nada. 

 

Afonso Cruz - Jesus Cristo Bebia Cerveja (2012)

Penguin Random House (2016)

 

 

 

 

 

 

Mais sobre mim

foto do autor

Sigam-me

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Links

  •  
  • Arquivo

    1. 2023
    2. J
    3. F
    4. M
    5. A
    6. M
    7. J
    8. J
    9. A
    10. S
    11. O
    12. N
    13. D
    14. 2022
    15. J
    16. F
    17. M
    18. A
    19. M
    20. J
    21. J
    22. A
    23. S
    24. O
    25. N
    26. D
    27. 2021
    28. J
    29. F
    30. M
    31. A
    32. M
    33. J
    34. J
    35. A
    36. S
    37. O
    38. N
    39. D
    40. 2020
    41. J
    42. F
    43. M
    44. A
    45. M
    46. J
    47. J
    48. A
    49. S
    50. O
    51. N
    52. D
    53. 2019
    54. J
    55. F
    56. M
    57. A
    58. M
    59. J
    60. J
    61. A
    62. S
    63. O
    64. N
    65. D
    66. 2018
    67. J
    68. F
    69. M
    70. A
    71. M
    72. J
    73. J
    74. A
    75. S
    76. O
    77. N
    78. D
    79. 2017
    80. J
    81. F
    82. M
    83. A
    84. M
    85. J
    86. J
    87. A
    88. S
    89. O
    90. N
    91. D
    92. 2016
    93. J
    94. F
    95. M
    96. A
    97. M
    98. J
    99. J
    100. A
    101. S
    102. O
    103. N
    104. D
    Em destaque no SAPO Blogs
    pub