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Nariz de cera

anotações e apontamentos que dizem tudo - de, por e para mim - por si mesmos.

anotações e apontamentos que dizem tudo - de, por e para mim - por si mesmos.

Nariz de cera

16
Jun21

são e normal (no meio da anormalidade aceite)

Cecília

Uma bela noite, um grupo de jovens - Rui Pêgo, Luís António Vitta, António Duarte, e António Campelo, operador da Rádio Renascença -, apareceram em casa de António Variações, onde, por iniciativa própria, mas obviamente com o apoio da Rádio, foram montar um estúdio de gravação. De camisola verde de gola alta, microfone verde, de lenço na cabeça, «e uma data de coisas penduradas, pulseiras, anéis», este abriu-lhes a porta. Era uma figura completamente fora de qualquer contexto habitual, num cenário espantoso, e nenhum deles estava preparado para...aquilo:

- Entrámos e... era tudo verde! Era de cortar a respiração. Tendo nós todos a ideia de que éramos muito informados e moderninhos, a verdade é que eu não estava de todo preparado para entrar numa casa toda verde, e ser recebido por um homem todo vestido de verde [...]

O espanto foi tal, que, segundo conta Rui Pêgo, ele e o António Duarte nem conseguiram falar muito, limitando-se a balbuciar umas amabilidades por ele os ter recebido, e a murmurar qualquer coisa como «vamos lá gravar e tal». Pelo seu lado, António Variações estava nervosíssimo. [...]

- Nervosíssimo mesmo! A única pessoa confortável nesta situação surreal era o Luís Vitta - que também não é uma figura muito normal. 

 

Manuela Gonzaga – António Variações, Entre Braga e Nova Iorque (2018)
Manuela Gonzaga e Bertrand Editora (2018)

 

 

 

 

07
Jun21

de dentro

Cecília

Era realmente um grande artista, porque ninguém o fabricou, nasceu de dentro. 

 

Manuela Gonzaga – António Variações, Entre Braga e Nova Iorque (2018)
Manuela Gonzaga e Bertrand Editora (2018) 

 

 

07
Jun21

soar

Cecília

Entretanto, ninguém parecia entender o que o António queria e eu pedi: deixem-me ficar sozinho com ele, vão tomar um café. Ele queria fazer uma versão do «Povo Que Lavas no Rio», o que era muito corajoso. Pegar numa coisa da Amália, já é corajoso, mas logo aquela! Eu pergunto-lhe, António, queres que isto soe como? E ele diz aquela frase emblemática:

«Entre Nova Iorque e a Sé de Braga.»

 

Manuela Gonzaga – António Variações, Entre Braga e Nova Iorque (2018)
Manuela Gonzaga e Bertrand Editora (2018)

 

 

 

26
Mai21

educação superada

Cecília

E lembra-se das vezes em que desciam juntos o Chiado, quando o acompanhou à Valentim de Carvalho, «e todos paravam para o olhar, mas não havia comentários desagradáveis. Havia espanto, um enorme espanto.»

 

Manuela Gonzaga – António Variações, Entre Braga e Nova Iorque (2018)
Manuela Gonzaga e Bertrand Editora (2018) 

 

 

18
Mai21

serviços de inteligência artística

Cecília

... no ano da graça de 1983 António Variações integrou a lista dos mais malvestidos «de Portugal» [...] O artista reage com olímpico desdém: «sabem lá eles o que é vestir» [...] Uma semana mais tarde, o caso volta a ser relatado pelo Contador Mor que «encontrou um punhadão de gente da RTP foi na festa dada na Charlie's Place para consagração dos mais elegantes e dos mais deselegantes da dificílima arte de vestir». E acrescenta quase com desdém: «António Variações, também um dos menos elegantes, que duvidou expressamente da capacidade do júri para avaliar estilos de bem-vestir.» Ao que António responde, mais ou menos, embora por outras palavras, «O estilo sou eu!» [...]

 

Manuela Gonzaga – António Variações, Entre Braga e Nova Iorque (2018)

Manuela Gonzaga e Bertrand Editora (2018)

 

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18
Mai21

constelações

Cecília

No princípio de junho de 1982, António Variações fez a primeira parte do espetáculo dos UHF, na Feira Popular, em playback, e sente-se «mais num ringue do que num palco» diante dos mais de cinco mil jovens que o vaiam e insultam. Apesar de tudo, consegue controlar a multidão, consideando que «valeu a pena, pois são sempre experiências necessárias». Na segunda parte, António Manuel Ribeiro, o carismático líder dos UHF, toma abertamente a sua defesa, e critica a multidão que está ali para o ver e ouvir a ele, dizendo-lhes: «António é uma das poucas pessoas deste País que tenta fazer uma coisa de novo na música portuguesa. Ele precisa de apoio, pois está a tentar formar uma banda e é coerente e corajoso.»

 

Manuela Gonzaga – António Variações, Entre Braga e Nova Iorque (2018)

Manuela Gonzaga e Bertrand Editora (2018)

 

 

14
Mai21

figuras cheias de cor

Cecília

E ele era uma figura apaixonante no deserto desta cidade tão provinciana na época, com uma meia de cada cor, os roupões, o fato-macaco, os sapatos diferentes, o visual tão criativo e tão fantástico. 

 

Manuela Gonzaga – António Variações, Entre Braga e Nova Iorque (2018)
Manuela Gonzaga e Bertrand Editora (2018)

 

 

12
Mai21

xô = eu+eu

Cecília

Meio pequeno, provinciano, deslumbrado. Como entender este ser extraordinário que desce a avenida da Liberdade com um chapéu colonial branco, a barba em bico, o queixo bem erguido e um papagaio de madeira em cores berrantes, empoleirado nos ombros? 

 

Manuela Gonzaga – António Variações, Entre Braga e Nova Iorque (2018)

Manuela Gonzaga e Bertrand Editora (2018)

 

 

12
Mai21

reflexos certos

Cecília

Luís Ribeiro e Maria Adosinda, o irmão e a cunhada, recordam o gozo que António punha em caricaturar algumas das suas clientes mais altivas, até por ter sentido na pele as barreiras sociais que o tinham marcado com o ferro em brasa do desprezo que os citadinos votavam aos rurais. Tinha 11 anos quando, vindo de Fiscal, Braga, desembarcara em Lisboa, mas os irmãos afirmam que, tanto tempo depois ele ainda «sofria com este tipo de coisas». Por outro lado, os relatos também referem, de forma unânime, o cuidado, o carinho, a gentileza que punha no trato com os idosos, e a forma como costumava dizer: «Toda a gente dá um beijinho e uma carícia a um bebé, mas esquecem-se dos idosos, que têm necessidades ainda mais importantes que uma criança, e ninguém lhes liga nenhuma». Era um homem calado, mas irónico, com um pendor satírico que poucos terão conhecido. Os irmãos e os amigos mais chegados recordam que ironizava muito com as coisas. E reagia, perante alguém que pensava que era superior a ele. 

 

Manuela Gonzaga – António Variações, Entre Braga e Nova Iorque (2018)

Manuela Gonzaga e Bertrand Editora (2018)

 

 

11
Mai21

overdoses homeopáticas

Cecília

- Falando por mim, só começo a gostar do Variações através da sucessiva passagem das maquetes que tínhamos feito com ele. Só começo a gostar, quando se cria uma familiaridade com aquele som e com aquele timbre. Porque a primeira reação é...overdose. Depois, e se há uma palavra que pode definir bem o Variações é uniqueness. Isto é, há uma singularidade nele que acaba por conquistar inevitavelmente o seu terreno, e acaba por conquistar as pessoas. Como conquistou - diz Rui Pêgo. 

 

Manuela Gonzaga – António Variações, Entre Braga e Nova Iorque (2018)
Manuela Gonzaga e Bertrand Editora (2018) 

 

 

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