A CENA DO ÓDIO
De José de Almada-Negreiros
Poeta Sensacionista e Narciso do Egipto
Ergo-Me Pederasta apupado d'imbecis.
(...)
Tu, que te dizes Homem!
Tu, que te alfaiatas em modas
e fazes cartazes dos fatos que vestes
pra que se não vejam as nódoas de baixo!
Tu, qu'inventaste as Ciências e as Filosofias,
as Políticas, as Artes e as Leis,
e outros quebra-cabeças de sala
e outros dramas de grande espectáculo...
Tu, que aperfeiçoas a arte de matar...
Tu que descobriste o cabo da Boa-Esperança
e o Caminho Marítimo da Índia
e as duas Grandes Américas,
e que levaste a chatice a estas terras
e que trouxeste de lá mais Chatos pr'aqui
e qu'inda por cima cantaste estes Feitos...
Tu, qu'inventaste a chatice e o balão,
e que farto de te chateares no chão
te foste chatear no ar,
e qu'inda foste inventar submarinos
pra te chateares também debaixo d'água...
Tu, que tens a mania das Invenções e das Descobertas
e que nunca descobriste que eras bruto,
e que nunca inventaste a maneira de o não seres...
Tu consegues ser cada vez mais besta
e a este progresso chamas Civilização!
(...)
(Há tanta coisa que fazer, Meu Deus!
e esta gente distraída em guerras!)
(...)
Oh! Se eu soubesse que o Inferno
não era como os padres mo diziam -
uma fornalha de nunca se morrer - ,
mas sim um Jardim da Europa
à beira-mar plantado...
(...)
E inda há quem faça propaganda disto:
a pátria onde Camões morreu de fome
e onde todos enchem a barriga de Camões!
Com a data de 14 de Maio de 1915