do casamento (II) - pas de deux
Cada vez acredito mais nisso: pode efectivamente haver bom sexo sem pecado. Mas não pode, nunca pôde, nem nunca poderá haver bom sexo sem mistério. Se muitos casais perdem o desejo ao fim de alguns anos, é porque o mistério desapareceu. Se outros tantos o mantêm latejante ao fim de várias décadas, é porque encontraram uma forma de reinventar o mistério. Feitas as contas, tem de haver sempre alguma espontaneidade - até alguma pressa, alguma urgência. E o melhor, apesar de tudo, é que o sexo seja muitas vezes bom e todas as restantes apenas assim-assim. No exacto instante em que for perfeito perderá dois terços do interesse, se não o interesse todo. Da próxima já não poderá ser melhor.
É claro: quatro quintos dos portugueses discordarão aberta e ostensivamente disto. Nos estudos sociológicos e nas conversas de café, nas telenovelas e nas reportagens «do social», não encontro outra coisa senão atletas sexuais - e nenhum atleta sexual alguma vez poderá ser surpreendido a aceitar que a sua última sessão foi apenas assim-assim (e muito menos que a próxima poderá ser assim-assim também).
Joel Neto, in 'Banda Sonora para um Regresso a Casa'