brilhos certos e o elogio de brilhos errados
Maria Adosinda, a cunhada, conta:
- Olhava para a minha sogra, brilhavam-lhe os olhos. Ela adorava-o e ele tinha um cuidado muito especial com ela.
No carro, dava-lhe sempre o lugar da frente. Ajudava-a a sentar-se, a levantar-se, dava-lhe o braço na rua. Mas se via uma dessas senhoras de nariz empinado e ar importante, dizia: Olha para aquilo, parecem mesmo umas peruas. Detestava as velhas da alta sociedade, porque não via nelas a sinceridade que se vê numa pessoa do campo, pobre, humilde... então, quando lhe aparecia uma cliente a dizer, eu gosto assim, mas o António que acha?, ele faria uma coisa correta. Mas se ela entrasse toda cheia de nove horas: Ai, eu isto, eu aquilo, assim não, quero tudo armado! ele exagerava tanto que ela saía do salão a parecer uma maluquinha. Depois vinha-nos contar e fartávamo-nos de rir.
Manuela Gonzaga – António Variações, Entre Braga e Nova Iorque (2018)
Manuela Gonzaga e Bertrand Editora (2018)