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Nariz de cera

anotações e apontamentos que dizem tudo - de, por e para mim - por si mesmos.

Nariz de cera

anotações e apontamentos que dizem tudo - de, por e para mim - por si mesmos.

lados de vidro

30.11.21

Esta alegria 

que de nada nasce

antes da palavra

sopro insubmisso

sortilégio do dia.

 

António Ramos Rosa in VINTE POEMAS PARA ALBANO MARTINS - Obra Poética I

Assírio & Alvim (2018)

 

 

ou vir ou

26.11.21

Estação

Esperar ou vir esperar querer ou vir querer-te vou perdendo a noção desta subtileza. Aqui chegado até eu venho ver se me apareço e o fato com que virei preocupa-me, pois chove miudinho
Muita vez
vim esperar-te e não houve chegada
De outras, esperei-me eu e não apareci
embora bem procurado entre os mais que passavam.
Se algum de nós vier hoje é já bastante
como comboio e como subtileza
Que dê o nome e espere. Talvez apareça

 

Mário Cesariny de Vasconcelos

(Lisboa, 9 de Agosto de 1923 — Lisboa, 26 de Novembro de 2006)

 

Naniôra – Uma e Duas (1960)
Mário Cesariny

dia de Santa Cecília

22.11.21

Stefano Moderno, "Saint Cecilia," 1599, church of St. Cecilia, Trastevere, Rome

In the sculpture, St. Cecilia extends three fingers with her right hand and one with her left, testifying to the Trinity. The sculptor attested that this was how the saint's body looked when her tomb was opened in 1599.

Photographed at the church of St. Cecilia, Trastevere, by Richard Stracke. 

https://pt.wikipedia.org/wiki/Cec%C3%ADlia_de_Roma#/media/Ficheiro:CeciliaMaderno.jpg

Faz sentido que Cecília seja a padroeira da música?
Em dia de Santa Cecília, padroeira da Música e dos músicos, voltemos o nosso olhar para aqueles e aquelas que dão a totalidade do que são a uma arte que, não só lhes exige toda a sua inteireza, como a pujança da sua vitalidade [...]

Parece-me, na verdade, que o nosso tempo, em muito marcado pela desconfiança e pela superficialidade, anseia por Verdade e coerência, e essas só são possíveis por via do testemunho sincero, do testemunho que robustece a mensagem com a vitalidade do mensageiro. E se isto assim é para tantas dimensões da nossa existência, é-o tanto mais para a cultura e, portanto, para os artistas. Quem são aqueles que nos marcam quando os escutamos? Quais são as vozes que nos ficam, que nos comovem, que nos abanam ou reconfortam? Estou convencido de que são as que estão carregadas da vida do cantor [...] vozes que, confessando as suas próprias convicções, se tornam proféticas no seu olhar sobre a realidade que os rodeia, apontando caminhos e esperando o melhor que virá. Este, a meu ver, é um dos papéis fundamentais de um músico, qualquer que seja o seu estilo, nos dias de hoje: o testemunho das suas próprias convicções, a profundidade naquilo que executa e transmite, o compromisso com o mundo que o rodeia [...]

Nos nossos dias, um músico sabe, à partida, que por amor à arte a que se sente chamado, virá a sofrer privações, a ter de tomar opções que, doutro modo, não seriam as suas. Por isso, a vocação de um músico tem também muito de sacrifício, isto é, de martírio, de entrega e até mesmo de possível sofrimento, além daquele que o próprio acto de criar lhe exige. Mas esse “martírio”, por outro lado, é também ele o que confirma o verdadeiro artista, em certo modo, à semelhança do ouro que é purificado pelo fogo: é prova e teste às suas convicções, que as robustece e fortalece a sua entrega àquilo a que se sente chamado.

Testemunho e martírio: duas características essenciais num músico dos nossos dias, que, provando a genuinidade da sua vocação artística, lhe conferem a solidez necessária para que a sua arte seja sinal profético, interpelador e profundo. Afinal, talvez faça mesmo sentido que Cecília seja a padroeira da Música…

in https://pontosj.pt/opiniao/faz-sentido-que-cecilia-seja-a-padroeira-da-musica/

 

antecipando o frio do inverno

18.11.21

Um mundo onde a ignorância é primavera

onde a alegria estremece deslumbrada 

 

António Ramos Rosa in O TEMPO - Obra Poética I

Assírio & Alvim (2018)

 

 

partes de um todo

16.11.21

Just as long as I stay
I'll be waiting
I'll be waiting
I'll be waiting
And when a child is born into this world
It has no concept
Of the tone the skin is living in
And there's a million voices
And there's a million voices
To tell you what she should be thinking

 

sade less

16.11.21

The truth is that Olive did not understand why age had brought with it a kind of hard-heartdness toward her husband. But it was something she had seemed unable to help, as though the stone wall that had rambled along between them during the course of their long marriage - a stone wall that separated them but also provided unexpected dips of moss-covered warm spots where sunshine would flicker between them in a sudden laugh of understanding  - had become tall and unyielding, and not providing flowers in its crannies but some ice storm frozen along it instead. In other words, something had come between them that seemed insurmountable. She could, on certain days, point out to herself the addition of a boulder here, a pile of rocks there [...] but she still did not understand why they should walk into old age with this high and horrible wall between them. And it was her fault. Because as her heart become more constricted, Henry's heart became needier, and when he walked up behind her in the house sometimes to slip his arms around her, it was all she could do to not visibly shudder. Stop!, she wanted to shout. (But why? What crime had he been committing, except to ask her love?)

 

Elizabeth Strout – Olive, Again (2019)
Penguin Random House UK (2019)

 

mesa no alto

15.11.21

Todo o mundo é música de água ou transparência.

A inteligência é o sabor completo do silêncio.

Onde estamos é a insondável delicadeza de uma estrela.

A criança está com a mãe numa nebulosa dourada.

[...]

Todo o nosso saber é uma ignorância fértil.

O ritmo das nuvens ordena as nossas mesas.

 

António Ramos Rosa in O TEMPO - Obra Poética I

Assírio & Alvim (2018)

 

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imagens: Cecília Carneiro

society, amplexo-te

09.11.21

O real é uma invenção deste opaco amplexo

em que o prodígio é a simplicidade e a opulência

de uma ignorância que habita a medula dos sentidos.

 

António Ramos Rosa in EXTREMAMENTE NUA - Obra Poética I

Assírio & Alvim (2018)

 

 

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