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Nariz de cera

anotações e apontamentos que dizem tudo - de, por e para mim - por si mesmos.

Nariz de cera

anotações e apontamentos que dizem tudo - de, por e para mim - por si mesmos.

ser eterno dentro

30.09.19

Volto a ser uma dama instada ao amor

às solicitações e aos rigores vibráteis do corpo

e mais, muito mais, à respiração ondulatória

porque eu sou da terra o sismo e o fulgor

só pelo negrume de meu amado respondo.

 

Entristecem-me as promessas mínimas do ventre aberto

por força do pouco e do muito ele querer

a paz do coágulo, a dor, o espasmo e o rubi

ai tudo posso dar-lhe, ao meu adepto, ruína das lutas,

o soma, o sarcófago e até o ser eterno dentro de mim.

 

 

Paulo da Costa Domingos in CAMPO DE TÍLIAS

 

 

Paulo da Costa Domingos – Carmina (1971-1994)
Antígona (1995)

 

 

(...)

He's gotta be sure
And it's gotta be soon
And he's gotta be larger than life

(...)

I could swear there is someone, somewhere
Watching me
Through the wind, and the chill, and the rain
And the storm, and the flood
I can feel his approach like a fire in my blood

(...)

 

sem perguntas ou condições

28.09.19

Um dos mais infames costumes observados na Prisão de Fleet, nos séculos dezassete e dezoito, era a celebração de cerimónias de casamento por clérigos desonestos e dissolutos. Estes funcionários, na sua maioria presos por motivo de dívidas, insultavam a dignidade da sua sagrada profissão ao casarem nas instalações da Prisão de Fleet, a qualquer instante, quaisquer pessoas que se apresentassem perante si para esse propósito. Não eram feitas perguntas, como não se impunham condições, exceto em relação à taxa cobrada pelo serviço ou à quantidade de bebida a emborcar na ocasião. Aconteceu frequentes vezes clérigo, escrivão e noivos estarem embriagados por altura da celebração da cerimónia. 

 

Wray Delaney - Memórias de Uma Cortesã  (2016)

Quinta Essência, Oficina do Livro (2017)

 

 

 

livre de influências

27.09.19

...as ficções sociais não são gente, em quem se possa dar tiros... Você compreende bem? Não era como o soldado de um exército que mata doze soldados de um exército contrário; era como um soldado que mata doze civis da nação do outro exército. É matar estupidamente, porque não se elimina combatente nenhum... Eu não podia portanto pensar em destruir, nem no todo nem em nenhuma parte, as ficções sociais. Tinha então que subjugá-las, que vencê-las subjugando-as, reduzindo-as à inactividade (...) Procurei ver qual era a primeira, a mais importante, das ficções sociais. Seria essa que me cumpria, mais que a nenhuma outra, tentar subjugar, tentar reduzir à inactividade. A mais importante, da nossa época pelo menos, é o dinheiro. Como subjugar o dinheiro, ou, em palavras mais precisas, a força, ou a tirania do dinheiro? Tornando-me livre da sua influência, reduzindo-o à inactividade pelo que me dizia respeito a mim (...)  Como podia eu tornar-me superior à força do dinheiro? O processo mais simples era afastar-me da esfera da sua influência, isto é, da civilização; ir para um campo comer raízes e beber água das nascentes; andar nu e viver como um animal. Mas isto, mesmo que não houvesse dificuldade em fazê-lo, não era combater uma ficção social; não era mesmo combater: era fugir. Realmente, quem se esquiva a travar um combate não é derrotado nele. Mas moralmente é derrotado, porque não se bateu. O processo tinha que ser outro - um processo de combate e não de fuga. Como subjugar o dinheiro, combatendo-o? Como furtar-me à sua influência e tirania, não evitando o seu encontro? O processo era só um - adquiri-lo, adquiri-lo em quantidade bastante para lhe não sentir a influência... 

 

 

Fernando Pessoa - O Banqueiro Anarquista (1922)
Antígona (2018)

 

 

 

proveitos

26.09.19

Ora a acção é sempre mais proveitosa que a propaganda, excepto para os indivíduos cujo feitio os indica essencialmente como propagandistas - os grandes oradores, capazes de electrizar multidões e arrastá-las atrás de si, ou os grandes escritores, capazes de fascinar e convencer com os seus livros. 

 

Fernando Pessoa - O Banqueiro Anarquista (1922)
Antígona (2018)

 

 

 

38

23.09.19

(...)

As palavras mais simples têm frio

como a palavra amor

como a palavra tempo

(...)

As palavras mais simples são as mais preciosas

como uma sombra vã

numa rua deserta 

 

 

António Ramos Rosa in À MEMÓRIA DE PAUL ÉLUARD

 

António Ramos Rosa - Obra Poética I 

Assírio & Alvim (2018)

 

 

 

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